Ainda lembro do cortejo...a cantoria triste...minha roupa branca de condenado no contraste com a minha negra cor...aquela criança não sai da minha cabeça...caminhava curiosa ao meu lado, no compasso do tambor do militar...a marcha era fúnebre...alguns aproveitavam o momento para fazer dinheiro...o Mariano era um deles, sonhava com um bom pecúlio e a alforria um dia comprar...para mim isso já não bastava...logo depois da primeira chibatada, apaguei...acordei com os gritos de quem me delatava...senhor e senhora no chão...ainda corri...mas sabia que logo minha passagem por aqui estaria acabada...da cadeia para a igreja...logo a ponte sobre o arroio onde tantas vezes acompanhei o pôr-do-sol...e lá estava eu subindo os degraus...o homem da religião do rei na minha frente aos prantos fingia seu interesse por minha alma...e eu fingia não ter medo...quieto...sofri...o rufar dos tambores...meus olhos se fecharam...logo estacionou o barco...finalmente livre...naveguei...como o tempo, tornei-me múltiplo...resisti!

sexta-feira, 17 de julho de 2020

Em brasa

Em brasa
Belizario, inverno 20.

Saudade, só é saudade,
Quando alguma coisa morreu.
Agoniza a alma,
É planta que seca,
Flor que murcha.
Feito esse amor,
Que foi teu e foi meu.
E aqui dentro vasculha,
Penetra,
Vira a carne,
Deixa em febre,
Fervendo em brasa...
O nosso adeus.

quinta-feira, 9 de julho de 2020

Espremido

Espremido
Belizario, outono 20.

Tuas costas...
Raios de sol batendo no quarto...
Iluminando teu corpo...
Teu beijo...
A ternura em ti...
Cada cotidiano teu.
Foi meu afortunado tempo.
O que resta de um sujeito,
Que por dentro,
Espremido,
Morreu?!

Mulher plena

Mulher plena
Belizario, outono 20.

É sempre assim...
Teu sorriso que abre em meia boca...tímida,
E depois escancara!
Olhos que piscam,
Numa sinfonia linda...cheia de vida!
Tua energia intensa,
Cada toque teu,
Que me enlouquece...
Me enfeitiça.
Ainda vou fritar,
De tanta boniteza,
No teu olhar,
Na tua alma,
Nos teus lábios,
No azul da tua retina.
É flor aberta em primavera.
É sol radiante em pleno inverno.
Mulher plena,
Lindíssima!

Embriagado

Embriagado
Belizario, primavera 09

Foi como um raio!
Que caiu na Rua da Margem, 512.
Teus olhos engoliram os meus.
Logo veio teu sorriso,
E eu que buscava embriagar-me,
Embriaguei-me...de ti!
Por ti...em mim.

A primavera não tarda a chegar

A primavera não tarda a chegar
Belizario, inverno 20.

Me abateu.
Nunca imaginei,
O país assim,
Fedendo como chiqueiro,
Da carniça fascista, putrefato!
Me doeu.
Pais e mães chorando,
Perdendo seus filhos e filhas,
Pelas balas genocidas...
De capangas fardados!
A flor é semente,
Que arde na terra,
desejo que a primavera não tarde a chegar!
Por enquanto,
É lamento...
De gente que se expõe a peste,
Pois precisa de alimento,
E forja no suspiro o seu sustento.
O tirano,
Desafortunado de ternura,
Que ri e debocha de nossa gente,
Coitado... medíocre,
É um poço sem fundo,
De maldade e tristeza...de desumanidade.
Erva daninha,
Espere, seu indecente!
A primavera não tarda a chegar!

Avança

Avança
Belizario, inverno 20.

Sinto que desta vez,
Quem está partindo sou eu.
Cansei de estender a mão.
Cansei de esmolar pelo chão,
De enxergar-te por todos os cantos.
Dói o peito,
Clama a esperança.
Toda poesia, 
Toda palavra,
É vã.
A correnteza me leva...não tarda...
Não tenho mais força.
É a vida que clama,
E me diz:
Companheiro, avança!

Tempo sem cor

Tempo sem cor
Belizario, outono 20.

Canta o passarinho da saudade.
Que vontade de te tocar,
De te olhar,
Entrelaçar teus dedos nos meus.
Passar a mão nos teus cabelos,
Te cantar versos,
De desejar teus gestos,
Todo amor que tu me deu.
Onde foi que te perdi?!
Para onde foi o nosso amor?!
Virou dejeto descartado,
Hoje vive no passado,
Um tempo sem cor!

Lamento

Lamento
Belizario, outono 20.

Lamento teu adeus.
Não há alento para este desamor.
Quem quer tudo, não tem nada...
E deixa pegadas de saudade e dor.
Ingrato sentimento este...
De ainda te querer.
Se faz alma deserta e o que era flor... murchou.
Onde perdi este eu,
Que mendiga afeto.
Arrebatado por um amor, que afogou?!