Ainda lembro do cortejo...a cantoria triste...minha roupa branca de condenado no contraste com a minha negra cor...aquela criança não sai da minha cabeça...caminhava curiosa ao meu lado, no compasso do tambor do militar...a marcha era fúnebre...alguns aproveitavam o momento para fazer dinheiro...o Mariano era um deles, sonhava com um bom pecúlio e a alforria um dia comprar...para mim isso já não bastava...logo depois da primeira chibatada, apaguei...acordei com os gritos de quem me delatava...senhor e senhora no chão...ainda corri...mas sabia que logo minha passagem por aqui estaria acabada...da cadeia para a igreja...logo a ponte sobre o arroio onde tantas vezes acompanhei o pôr-do-sol...e lá estava eu subindo os degraus...o homem da religião do rei na minha frente aos prantos fingia seu interesse por minha alma...e eu fingia não ter medo...quieto...sofri...o rufar dos tambores...meus olhos se fecharam...logo estacionou o barco...finalmente livre...naveguei...como o tempo, tornei-me múltiplo...resisti!

sexta-feira, 17 de julho de 2020

Em brasa

Em brasa
Belizario, inverno 20.

Saudade, só é saudade,
Quando alguma coisa morreu.
Agoniza a alma,
É planta que seca,
Flor que murcha.
Feito esse amor,
Que foi teu e foi meu.
E aqui dentro vasculha,
Penetra,
Vira a carne,
Deixa em febre,
Fervendo em brasa...
O nosso adeus.

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