Ainda lembro do cortejo...a cantoria triste...minha roupa branca de condenado no contraste com a minha negra cor...aquela criança não sai da minha cabeça...caminhava curiosa ao meu lado, no compasso do tambor do militar...a marcha era fúnebre...alguns aproveitavam o momento para fazer dinheiro...o Mariano era um deles, sonhava com um bom pecúlio e a alforria um dia comprar...para mim isso já não bastava...logo depois da primeira chibatada, apaguei...acordei com os gritos de quem me delatava...senhor e senhora no chão...ainda corri...mas sabia que logo minha passagem por aqui estaria acabada...da cadeia para a igreja...logo a ponte sobre o arroio onde tantas vezes acompanhei o pôr-do-sol...e lá estava eu subindo os degraus...o homem da religião do rei na minha frente aos prantos fingia seu interesse por minha alma...e eu fingia não ter medo...quieto...sofri...o rufar dos tambores...meus olhos se fecharam...logo estacionou o barco...finalmente livre...naveguei...como o tempo, tornei-me múltiplo...resisti!

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A maré tá cheia

A maré tá cheia
Belizario, inverno 11.

A maré tá cheia.
O rio sobe o cais, beija a terra...
Delicio-me com a formosura do encontro.
Sou eu entre eles,
me equilibrando sob o vão do que restou sobre a água.
Basta apenas soltar o corpo...
E ele me leva... pra longe...
Quem sabe onde posso chegar.

A maré tá cheia...
Mas navegante, cuidado.
Esse rio quando transborda,
corre pra trás.

Nenhum comentário:

Postar um comentário