Ainda lembro do cortejo...a cantoria triste...minha roupa branca de condenado no contraste com a minha negra cor...aquela criança não sai da minha cabeça...caminhava curiosa ao meu lado, no compasso do tambor do militar...a marcha era fúnebre...alguns aproveitavam o momento para fazer dinheiro...o Mariano era um deles, sonhava com um bom pecúlio e a alforria um dia comprar...para mim isso já não bastava...logo depois da primeira chibatada, apaguei...acordei com os gritos de quem me delatava...senhor e senhora no chão...ainda corri...mas sabia que logo minha passagem por aqui estaria acabada...da cadeia para a igreja...logo a ponte sobre o arroio onde tantas vezes acompanhei o pôr-do-sol...e lá estava eu subindo os degraus...o homem da religião do rei na minha frente aos prantos fingia seu interesse por minha alma...e eu fingia não ter medo...quieto...sofri...o rufar dos tambores...meus olhos se fecharam...logo estacionou o barco...finalmente livre...naveguei...como o tempo, tornei-me múltiplo...resisti!

terça-feira, 14 de julho de 2015

Bela Cigana


Bela Cigana
João Nogueira

Anda retira de cima esse manto de medo
Abre essa mão que eu vou revelar um segredo
Vou, meu irmão, lhe ensinar beber água na fonte
Poder caminhar os caminhos do monte
Aonde amanhã novo sol vai nascer
É, nessa vida ninguém foge porque tem medo
É justamente o contrário, medrou quem fugiu
Vai meu irmão rasga as folhas do teu samba-enredo
Desvia teus barcos dos velhos rochedos
Mais tarde ou mais cedo meu darás razão
E foi assim que me disse a bela cigana
De brincos de ouro, de porte de dama
De vida e de morte no fundo do olhar
Leu minha mão e rezou e levou meu dinheiro
Mas a tal cigana não sabe, talvez
Tirou meu veleiro do fundo do mar


Versão em música:
https://www.youtube.com/watch?v=yo9oSmx4zNc

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