Ainda lembro do cortejo...a cantoria triste...minha roupa branca de condenado no contraste com a minha negra cor...aquela criança não sai da minha cabeça...caminhava curiosa ao meu lado, no compasso do tambor do militar...a marcha era fúnebre...alguns aproveitavam o momento para fazer dinheiro...o Mariano era um deles, sonhava com um bom pecúlio e a alforria um dia comprar...para mim isso já não bastava...logo depois da primeira chibatada, apaguei...acordei com os gritos de quem me delatava...senhor e senhora no chão...ainda corri...mas sabia que logo minha passagem por aqui estaria acabada...da cadeia para a igreja...logo a ponte sobre o arroio onde tantas vezes acompanhei o pôr-do-sol...e lá estava eu subindo os degraus...o homem da religião do rei na minha frente aos prantos fingia seu interesse por minha alma...e eu fingia não ter medo...quieto...sofri...o rufar dos tambores...meus olhos se fecharam...logo estacionou o barco...finalmente livre...naveguei...como o tempo, tornei-me múltiplo...resisti!

sábado, 1 de outubro de 2011

O negro fala sobre rios

O negro fala sobre rios
Langston Hughes
Tradução: Carlos Machado


Conheço rios:
Conheço rios tão antigos quanto o mundo e mais
velhos que o fluxo de sangue humano
nas veias humanas.

Minha alma se tornou profunda como os rios.

Banhei-me no Eufrates quando eram jovens as
auroras.
Construí minha cabana junto ao Congo e ele
me cantou canções de ninar.

Olhei para o Nilo e acima dele levantei as
pirâmides.
Ouvi o canto do Mississippi quando Abe Lincoln
desceu até New Orleans e vi seu seio
lamacento tornar-se ouro, ao pôr-do-sol.

Conheço rios:
Antigos, cinzentos rios.

Minha alma se tornou profunda como os rios.

Nenhum comentário:

Postar um comentário