Ainda lembro do cortejo...a cantoria triste...minha roupa branca de condenado no contraste com a minha negra cor...aquela criança não sai da minha cabeça...caminhava curiosa ao meu lado, no compasso do tambor do militar...a marcha era fúnebre...alguns aproveitavam o momento para fazer dinheiro...o Mariano era um deles, sonhava com um bom pecúlio e a alforria um dia comprar...para mim isso já não bastava...logo depois da primeira chibatada, apaguei...acordei com os gritos de quem me delatava...senhor e senhora no chão...ainda corri...mas sabia que logo minha passagem por aqui estaria acabada...da cadeia para a igreja...logo a ponte sobre o arroio onde tantas vezes acompanhei o pôr-do-sol...e lá estava eu subindo os degraus...o homem da religião do rei na minha frente aos prantos fingia seu interesse por minha alma...e eu fingia não ter medo...quieto...sofri...o rufar dos tambores...meus olhos se fecharam...logo estacionou o barco...finalmente livre...naveguei...como o tempo, tornei-me múltiplo...resisti!

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

No Banho

No Banho
Lobo da Costa no livro Dispersas

Na fresca praia das belas
- Do mar o rosado vaso, -
Banhavam-se umas donzelas,
Quando passei por acaso.

Batia a lua nas águas,
Com poético clarão,
E as vagas, lambendo as fráguas,
Encantavam a soi'dão!

Em terra, a velha, sentada...
A pobre velha viúva,
Riscava a areia molhada
Co'a ponta do guarda-chuva.

Os gritos, as risadinhas,
Das lindas moças, no banho,
Atraem as vistas minhas,
E chego, apesar de estranho.

E caio n'agua... a velhota,
Não me viu... toma rapé,
E apenas diz em risota:
- "Cuidado com o jacaré!"

Afinal, a mais bonita,
Filei mesmo por um pé,
Enquanto a velhinha grita
- "Cuidado com o jacaré!"

Que gozo estranho! que dita!
A onda nos embalava,
Ora a terra facilita,
Ora o mar nos carregava!

E a velha sempre gritando:
- "Cuidado com o jacaré!"
E nós, nas ondas, rolando...
E a velha a tomar rapé...

Porto Alegre, 1885.

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