Ainda lembro do cortejo...a cantoria triste...minha roupa branca de condenado no contraste com a minha negra cor...aquela criança não sai da minha cabeça...caminhava curiosa ao meu lado, no compasso do tambor do militar...a marcha era fúnebre...alguns aproveitavam o momento para fazer dinheiro...o Mariano era um deles, sonhava com um bom pecúlio e a alforria um dia comprar...para mim isso já não bastava...logo depois da primeira chibatada, apaguei...acordei com os gritos de quem me delatava...senhor e senhora no chão...ainda corri...mas sabia que logo minha passagem por aqui estaria acabada...da cadeia para a igreja...logo a ponte sobre o arroio onde tantas vezes acompanhei o pôr-do-sol...e lá estava eu subindo os degraus...o homem da religião do rei na minha frente aos prantos fingia seu interesse por minha alma...e eu fingia não ter medo...quieto...sofri...o rufar dos tambores...meus olhos se fecharam...logo estacionou o barco...finalmente livre...naveguei...como o tempo, tornei-me múltiplo...resisti!

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Renasce a ode de Lorca em Canguçu

Renasce a ode de Lorca em Canguçu
Lucio Xavier

Reencarnado;
aquele belo rosto,
de menina:
fechada,
imaculada,
irredutível solta
pelos campos de Lorca.
A vida corre
e lhe oferece
A aflição urbana.
Belas rudes mãos
lhe puxam de um limite à tona.
Indifere seu sentido,
na pura,
simples,
feliz
e suficiente lide de azeitona!
No futuro repetido,
o mesmo rosto
da Espanha primordial,
nasce enraizado
Numa face de cristal;
efêmera vontade de ficar
medo de perder,
ânsia de ganhar um mundo
que lhe agride,
lhe proíbe!
A mão de agora
não mais puxa.
Quer lhe plantar!
O belo rosto se redime,
dá sentido,
ouve,
sonha
e reinventa
os passantes de Granada para Sevilha.
Prova para história
a independência de um ser rural,
por mãos que lhe percam,
achem
e reencontrem.
Seu sentido, agora,
esconde a raiz na terra arada!
Urbana?
Por lei.
Passa nítida
e se compõe,
permitindo para si
o campo na alma,
contra toda ilusão
que a cidade lhe semeia.

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