Ainda lembro do cortejo...a cantoria triste...minha roupa branca de condenado no contraste com a minha negra cor...aquela criança não sai da minha cabeça...caminhava curiosa ao meu lado, no compasso do tambor do militar...a marcha era fúnebre...alguns aproveitavam o momento para fazer dinheiro...o Mariano era um deles, sonhava com um bom pecúlio e a alforria um dia comprar...para mim isso já não bastava...logo depois da primeira chibatada, apaguei...acordei com os gritos de quem me delatava...senhor e senhora no chão...ainda corri...mas sabia que logo minha passagem por aqui estaria acabada...da cadeia para a igreja...logo a ponte sobre o arroio onde tantas vezes acompanhei o pôr-do-sol...e lá estava eu subindo os degraus...o homem da religião do rei na minha frente aos prantos fingia seu interesse por minha alma...e eu fingia não ter medo...quieto...sofri...o rufar dos tambores...meus olhos se fecharam...logo estacionou o barco...finalmente livre...naveguei...como o tempo, tornei-me múltiplo...resisti!

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Infância vivida, lugar especial

Infância vivida, lugar especial
Belizario, inverno 10.

Laranjal!
Tuas ruas de barro...tuas ruas de vagalume...
Que não existem mais...asfalto!
Teu cheiro a mato...tuas casas de folhas de bananeira...tuas figueiras dos bugios...
Que não existem mais...desmato!
Tuas valetas que mais eram córregos de onde vertiam a água, o suco da floresta, as pescarias de girino...
Que não existem mais...esgoto!
Bicicletas no ombro...travessia pelo pântano até a barra...fritada de jundiá, mandinho, pintado...
Que não existem mais...carro!
Noitadas de poesia, beijos e amor embaixo da lua, no berço da lagoa, cheiro de areia...
Que não existem mais...baladas!
Ainda verto paixões por esse lugar.
Ainda sinto o gosto da ameixa amarela roubada aos gritos desesperados do cusco...
Ainda sinto o vento na cara, as pernas bambas na frenética bicicleta, depois de um beijo roubado...
Ainda comemoro os gols, mesmo os de canela, no campinho, caixa d’água, eucaliptos, maracalombo,...
Laranjal, das histórias de fantasmas...
Da cunhã, da pretinha, do rex, do fico, da polenta...do cheiro a cachorro!
Que ainda guarda o meu maior legado.
Infância vivida...
O canto dos pássaros...
Gosto de liberdade...
Mãe e Pai!

Nenhum comentário:

Postar um comentário