Ainda lembro do cortejo...a cantoria triste...minha roupa branca de condenado no contraste com a minha negra cor...aquela criança não sai da minha cabeça...caminhava curiosa ao meu lado, no compasso do tambor do militar...a marcha era fúnebre...alguns aproveitavam o momento para fazer dinheiro...o Mariano era um deles, sonhava com um bom pecúlio e a alforria um dia comprar...para mim isso já não bastava...logo depois da primeira chibatada, apaguei...acordei com os gritos de quem me delatava...senhor e senhora no chão...ainda corri...mas sabia que logo minha passagem por aqui estaria acabada...da cadeia para a igreja...logo a ponte sobre o arroio onde tantas vezes acompanhei o pôr-do-sol...e lá estava eu subindo os degraus...o homem da religião do rei na minha frente aos prantos fingia seu interesse por minha alma...e eu fingia não ter medo...quieto...sofri...o rufar dos tambores...meus olhos se fecharam...logo estacionou o barco...finalmente livre...naveguei...como o tempo, tornei-me múltiplo...resisti!

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Lanceiros Negros

Lanceiros Negros
De Oliveira Silveira no livro Pêlo Escuro


Carga de lança - diante do inimigo
a noite
uma noite pontuda
de ir rasgando entranhas
como rasgava roupas
pele
carne
tudo
a sanha
de não velhos açoites.

Carga de lança - no campo da luta
a noite
negra e pontiaguda.
Sombras noturnas rolam no horizonte,
há nuvens de sangue no chão.
E cada lanceiro estendido
é uma noite pisoteada
- roupas e entranhas rasgadas -
noite que ficou
para sempre libertada.

Carga de lança - noite alforriada.

2 comentários:

  1. Apesar da traição, noite que ficou pra sempre libertada. Carga de lança, mesmo já sem lança- noite alforriada. Sou mestiço, meio branco, meio negro, por isso tenho a honra de ser um pouco de Lanceiro Negro. 20 de setembro, homenagem a "Revolução Farroupilha".

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